quarta-feira, 12 de agosto de 2009

“Mestiça, mineira, guerreira”


Se ainda estivesse entre nós, Clara Francisca Gonçalves estaria completando hoje 67 anos! Para os que ainda não conseguiram ligar o nome a pessoa, informo que estou falando da eterna diva do samba CLARA NUNES e foi o desejo de homenageá-la que me trouxe aqui! Segue o texto que costurei baseado na leitura que fiz do livro: “Clara Nunes – Guerreira da Utopia”, de Vagner Fernandes, da Ediouro, 2007.

Quando eu vim de Minas...

Irmã caçula de seis irmãos, Clara nasceu em 12 de agosto de 1942, na cidadezinha de Paraopeba - hoje Caetanópolis -, no estado de Minas Gerais. Iniciou sua carreira artística participando de Festivais musicais nas rádios de Belo Horizonte, eventos muito comuns naquela época e que serviram de vitrine para o seu talento e carisma...
Após vencer a etapa regional do concurso “A voz de Ouro ABC” e gravar o primeiro compacto pela gravadora ODEON – atual EMI -, Clara Nunes – já usando o sobrenome de sua mãe artisticamente - deu seu primeiro passo para o sucesso, tornando-se celebridade na capital mineira e participando das principais festas e eventos daquele ano.
Em 1965, em busca de novas oportunidades, mudou-se para a cidade do Rio de Janeiro. Na capital carioca sua vida mudaria para sempre: flertou com a jovem-guarda, gravou discos, conheceu a umbanda, a Portela, passou por grandes transformações e conviveu com pessoas importantes que a auxiliaram durante a caminhada que lhe consagrou como a maior sambista do Brasil - embora sempre insistisse em se descrever como uma cantora dos ritmos de seu país!

Novos rumos...


Em meados de 66, 67 quando ainda não havia se descoberto uma excepcional sambista, Clara Nunes insistia num repertório composto de boleros e melodias açucaradas, sendo a maioria versões de músicas francesas, italianas e americanas. O resultado dessa experiência nunca foi o esperado, os compactos dessa época foram verdadeiros fracassos em vendas, mas isso nunca diminuiu a capacidade de Clara de emocionar seu público interpretando canções românticas!

1974 foi um ano de consagração. Com o disco “Alvorecer” nas lojas, reaparece completamente reinventada. Novo visual, novo repertório, uma mudança que se iniciou em 71 com o importante auxílio do radialista paranaense Aldezon Alves, conhecido como “o amigo da madrugada”. Um verdadeiro marco em sua trajetória artística. Nascia a “Clara Mestiça” que em pouco tempo se tornaria a maior vendedora de discos do país... justo numa época em que as gravadoras afirmavam veementemente que mulher não vendia discos (vejam que ironia se compararmos a realidade atual do mercado fonográfico). Mas Clara provou que sim! Só com “Alvorecer” ultrapassou a marca de 400 mil cópias. Não tinha pra ninguém! Nem Bethânia, nem Gal Costa, nem Elis Regina... Ninguém vendia mais discos que Clara Nunes no Brasil!

Curiosidades...


Nesse trabalho de 74 – ano em que foi eleita a melhor cantora do ano pela primeira vez – encontra-se um de seus maiores sucessos, cuja inspiração da letra veio de uma lenda baiana que conta a história da uma mulher de um pescador que desapareceu misteriosamente no mar. Desde então, ela passa a andar solitária pela beira-mar, na esperança de vê-lo voltar... estou falando de “conto de areia”, canção que escolheu para casar em 75 com o reconhecido compositor Paulo César Pinheiro!

Mas esse era apenas o início de uma carreira consistente, repleta de muitos triunfos e milhares de LP´s vendidos... grandes sucessos da música popular brasileira fizeram história e foram imortalizados através de suas interpretações. Seus shows também eram espetáculos a parte. No palco, Clara tinha como costume hipnotizar platéias por onde passava e fazia questão de oferecer ao seu público o que de melhor havia em sua arte. Selecionava cuidadosamente os melhores prosissionais e redobrava o cuidado no momento de escolher seu repertório... só cantava o que acreditava!

Em maio de 1980, Clara Nunes visitou a África a convite do cantor e compositor Chico Buarque, que organizou uma caravana composta de vários músicos brasileiros para se apresentar em Angola. O projeto chamava-se: “Kalunga” e toda sua renda foi destinada a construção de um hospital para sua capital, destruída pela Guerra Civil que devastou Luanda. Foi nessa atmosfera de música, emoção e fé que nasceu outro grande clássico. Feita por Chico a pedido da própria cantora, “Morena de angola” abriu o repertório do LP “Brasil Mestiço”, um dos mais aclamados discos de carreira do “sabiá mineiro”, que certamente contribuiu para garantir o título de melhor cantora também naquele ano!


Religiosidade...

Muitas vezes rotulada como uma "cantora de macumba” por uma oposição insensível e pela crítica preconceituosa, Claridade – como era carinhosamente chamada pelos mais íntimos como a cantora Alcione, por exemplo – lidava com a sua religiosidade de forma aberta e honesta. Era corajosa e convicta em relação a todos os assuntos que envolviam sua crença, que representava a base de sua força e que por isso mesmo, muitas vezes, se misturava e confundia com a sua arte!


Na maioria das vezes denominava-se umbandista, “filha de Ogum com Yansã”, mas nunca se contentou com uma única vertente religiosa... em se tratando de fé, não fechava portas... flertava com candomblé, tomava passes em centros Kardecistas e não deixa de lado suas orações do catolicismo. Dizia: “Eu sou uma espiritualista por natureza. Pratico, respeito muito e sou muito feliz com minha religiosidade. É uma coisa que me satisfaz!”

Em 1977 quando comprou o "Teatro Clara Nunes”, fez questão que fosse benzido tanto por um padre, como por um Pai de Santo, o que causava estranheza por parte dos mais conservadores. A mídia, a exemplo do que acontece hoje, também fazia a festa! Mas de uma coisa ela tinha certeza: Era a fé em Deus e seus orixás que a conduzia pelos melhores caminhos e lhe trazia conforto e proteção... “Saravá”!


Clara mulher...

Mas nem tudo eram só flores na vida da mulher Clara Nunes. Enquanto colhia os louros de uma carreira bem sucedida e colecionava sucessos de público e crítica em seus shows e discos, algumas passagens lhe trouxeram grandes tristezas, como por exemplo, o fato de nunca ter conseguido ser mãe, um de seus maiores desejos pessoais. Foram 03 abortos espontâneos que abalaram profundamente sua vida pessoal.
Porém, passadas as tempestades, a mineira sempre reagia bravamente e continuava a elevar o espírito das pessoas quando cantava. Não é por acaso que ficou imortalizada como: GUERREIRA! Talvez por conta das consecutivas provações pela qual passara desde a sua infância humilde em Paraopeba, Clara tenha aprendido a traduzir tão bem a dor do povo batalhador e por muitas vezes fez ecoar noite e dia a voz dos excluídos...


Basta um dia...


O sucesso de Claridade não se resumiu apenas ao seu país. Durante sua curta passagem entre nós, fez grandes apresentações pelo mundo á fora: América Latina, Europa, África... Sua voz corria chão, cruzava o mar... No Brasil gravou composições de grandes sambistas, descobriu novos talentos, ditou moda, foi referência e contribuiu para o fortalecimento do samba como um dos gêneros musicais mais importantes do país.

(...)


Muito vaidosa, ao chegar no hotel após um show que fez em Berlim, Clara ligou de madrugada para sua amiga Bibi Ferreira e disse: “Ai, Bibi, estou péssima. Estava dançando bem na frente do palco diante de um monte de pessoas sentadas à mesa. Todos olhavam demais para minha perna... Verifiquei que existe uma veia estranha, acho que vou tirá-la quando chegar no Brasil”!


(...)


Clara Nunes morreu no dia 02 de abril de 1983, após 28 dias em coma, vítima de uma reação alérgica durante uma cirurgia para retirada de varizes. Meses antes, passou as festas de fim de ano com o marido, Paulo César, em sua cidade natal. Segundo testemunhos, Clara estava estranha, fez questão de visitar parentes distantes que a muitos anos não via, percorreu paisagens de sua infância humilde e matou a saudade de tudo que lhe serviu como base para se tornar uma grande artista... No retorno para casa, como numa premonição, foi categórica: “Nunca mais verei isso aqui novamente”!


Ela estava certa. Após o anúncio oficial de sua morte, uma verdadeira comoção tomou conta do país de norte a sul! Mais de cinquenta mil pessoas lotaram a quadra da Portela, o Portelão, onde Clara foi velada. Pétalas de rosas, papel picado e lenços brancos enfeitavam o céu e as ruas em sinal de adeus a artista que sempre foi sinônimo de alegria e força...
o samba ficara órfão de sua grande dama!

Para os praticantes do candomblé o ocorrido se deu devido à imprudência da cantora ao realizar uma cirurgia na época da quaresma. Para os fãs inconformados, um criminoso erro médico. Para as autoridades da época, apenas uma fatalidade.


Mas como bem diz a letra do samba feito em sua homenagem: “Ela se foi pra cantar, muito além do luar, onde moram as estrelas! Adeus meu sabiá, até um dia!”... pra nós ficou a imagem da artista autêntica e emblemática, imortalizada no imaginário pupular e nas músicas que de tão importantes e feitas com tanta verdade, soam como atuais até hoje e ainda vão conquistar muitas gerações!


PARABÉNS, CLARIDADE!


Apolinário Jr.

6 comentários:

Angélica disse...

Puxa! Jú, vc acertou em cheio gosto muito de Clara Nunes, quer dizer aprendi a gostar pois meu pai é fã então cresci ouvindo os lps dela não estranhe lps mesmo. " É água do mar é maré cheia ô, clareia ô clareia" Valeu!!!!

CRISTIANE disse...

Não esperava encontrar com Clara Nunes hoje! Meu Deus, como o tempo passa rápido... lembro daquela figura especial na tv, geralmente de branco e com um sorriso iluminado! Aprendi muito sobre sua história hoje e pra variar um pouco, AMEI O TEXTO DE HOJE!

Beijos, parabéns para Clara onde quer que ela esteja!
Cris.

NANDITA CAYMMI disse...

Eu adoroo Clara Nunes. Ela tbm fez muito sucesso por aki pela Bahia... Sempre há homenagens para ela no Pelourinho. Confesso q nao conheço tao a fundo o seu trabalho...
mas... ela gravou o rei.. o Chico Buarque em sua mais marcante:
"Morena de angola que leva o chocalho amarrado na canela... Sera que ela mexe o chocalho ou chocalho é que mexe com ela..."

bjosssssssssss

Josianne disse...

Júuu cheguei! Que lindo o que vc colocou pra mim no post anterior, amei!!! Obrigada amor, fiquei torrada de felicidade! kkkkkk
Eu conheço muito pouco Clara Nunes, amo aquela música da "morena de Angola" mas nunca passei de músicas conhecidas, como essa, mas com certeza ela fez historia na MPB e brilhou muito.
Beijoooos, ate o msn.

. disse...

André Agui.
Muito bom cara, gosto muito dela!

Abraço

Cláudia disse...

RESUMINDOOOO.......Virei FÃ!!!!

Bjss
Cláudia

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