quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

HOMEM NO MAR!



"De minha varanda vejo, entre árvores e telhados, o mar. Não há ninguém na praia, que resplende ao sol. O vento é nordeste, e vai tangendo, aqui e ali, no belo azul das águas, pequenas espumas que marcham alguns segundos e morrem, como bichos alegres e humildes; perto da terra a onda é verde.


Mas percebo um movimento em um ponto do mar; é um homem nadando. Ele nada a uma certa distância da praia, em braçadas pausadas e fortes; nada a favor das águas e do vento, e as pequenas espumas que nascem e somem parecem ir mais depressa do que ele. Justo: espumas são leves, não são feitas de nada, toda sua substância é água e vento e luz, e o homem tem sua carne, seus ossos, seu coração, todo seu corpo a transportar na água.



Ele usa os músculos com uma calma energia; avança. Certamente não suspeita de que um desconhecido o vê e o admira porque ele está nadando na praia deserta. Não sei de onde vem essa admiração, mas encontro nesse homem uma nobreza calma, sinto-me solidário com ele, acompanho o seu esforço solitário como se ele estivesse cumprindo uma bela missão. Já nadou em minha presença uns trezentos metros; antes, não sei; duas vezes o perdi de vista, quando ele passou atrás das árvores, mas esperei com toda confiança que reaparecesse sua cabeça, e o movimento alternado de seus braços. Mais uns cinqüenta metros, e o perderei de vista, pois um telhado a esconderá. Que ele nade bem esses cinqüenta ou sessenta metros; isto me parece importante; é preciso que conserve a mesma batida de sua braçada, e que eu o veja desaparecer assim como o vi aparecer, no mesmo rumo, no mesmo ritmo, forte, lento, sereno. Será perfeito; a imagem desse homem me faz bem.


É apenas a imagem de um homem, e eu não poderia saber sua idade, nem sua cor, nem os traços de sua cara. Estou solidário com ele, e espero que ele esteja comigo. Que ele atinja o telhado vermelho, e então eu poderei sair da varanda tranqüilo, pensando — "vi um homem sozinho, nadando no mar; quando o vi ele já estava nadando; acompanhei-o com atenção durante todo o tempo, e testemunho que ele nadou sempre com firmeza e correção; esperei que ele atingisse um telhado vermelho, e ele o atingiu".


Agora não sou mais responsável por ele; cumpri o meu dever, e ele cumpriu o seu. Admiro-o. Não consigo saber em que reside, para mim, a grandeza de sua tarefa; ele não estava fazendo nenhum gesto a favor de alguém, nem construindo algo de útil; mas certamente fazia uma coisa bela, e a fazia de um modo puro e viril.


Não desço para ir esperá-lo na praia e lhe apertar a mão; mas dou meu silencioso apoio, minha atenção e minha estima a esse desconhecido, a esse nobre animal, a esse homem, a esse correto irmão."


Rubem Braga- Janeiro, 1953.

Outras palavras...


"Eu me criei no molhado, areia e pedra do lado, berço de uma sereia"
Djavan.

Também me sinto um homem do mar... mas como Rubem Braga sou aquele que espia da varanda! Me criei entre areia, pedras e muita água salgada, mas numa conversa recente com minha amiga Lílian, que mora longe do mar, refleti sobre um constatação no mínimo curiosa: nunca aprendi a nadar! Me entrego ao mar com a cara, a coragem e muito respeito! É ele quem sempre me diz até onde posso ir... e essa sensação é melhor que nadar, é flutuar e flutuar é quase como voar!
Quando entro na praia, sem medo, são as ondas, vivas, que me dizem o que devo fazer! Quando submerso no verde esmeralda desse oceano, que observo da minha janela todas as manhãs, é como se voltasse ao ventre materno e ao contrário do que deveria ser, me sinto novamente protegido!

Foi esse sentimento que trouxe essa crônica para 'quarta da poesia' de hoje! Espero que você aceite o meu convite para um mergulho!
Fico por aqui... uma quarta iluminada...

Jr Vilanova.

6 comentários:

Carol Sakurá disse...

Oi Junior!
Amanhã irei encontrar-me com ele,o MAR!
A nau da minha alma navegará em suas ondas.

Bjs!

Unknown disse...

"é como se voltasse ao ventre materno"... que lindo isso! Que imagem poética gostosa de se imaginar!

O mar é um mistério a parte para todos nós, mas uma coisa é mesmo certa, é preciso muito respeito para se lidar com as coisas que vem de lá...

Bjos.
Cris.

Guilherme disse...

TCHIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIIBUUUUUUUUMMMMMMMMMMMM!

(Glub, glub, glub...)

- Tem oxigênio aí?

(Rsssss....)

Vc é lindo, cara!

Abração!

Dalva Nascimento disse...

Olha, também sou mulher do mar,
e não resisto ao verde mistério de suas águas!
Não tem coisa mais inspiradora do que ele...não é a toa que tanta poesia nasce de suas águas.

Bjs.

P.S.: Só para inspirar:

"Viver na Beira-Mar

Nunca o mar foi tão ávido
quanto a minha boca. Era eu
quem o bebia. Quando o mar
no horizonte desaparecia e a areia férvida
não tinha fim sob as passadas,
e o caos se harmonizava enfim
com a ordem, eu
havia convulsamente
e tão serena bebido o mar."

Fiama Hasse Pais Brandão, in "Três Rostos - Ecos"

Cláudia disse...

E nos que somos agraciados com tantas belezas naturais impossivel nao nos sentirmos homens do mar!!!

Linda mensagem!
bjs

Sampaio disse...

Arrasou no novo layout do seu blog...
Voltei!
Abração e ótima semana!
:o)

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